A população rural do Ceará continua deixando sua região e buscando emprego nas cidades-polo do Estado. O deslocamento de 31 mil pessoas para centros urbanos nos últimos dois anos foi registrado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), divulgada em novembro deste ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A seca prolongada é o motivo da migração de agricultores e agricultoras, contudo a experiência de produzir alimentos agroecológicos para consumo próprio e para comercialização tem mostrado possibilidades de fonte de renda e permanência dos homens e mulheres no campo. Com o acompanhamento e apoio de equipe técnica, os habitantes do semiárido cearense passam a fornecer alimentos sem agrotóxicos, produzir artesanato e criar pequenos rebanhos.
Há 40 anos, o Esplar e outras organizações não governamentais ensinam famílias de 41 municípios cearenses como cultivar roçados, hortas, quintais produtivos e trabalhar com pecuária em bases sustentáveis. Apenas no primeiro semestre de 2015, 2.365 pessoas de comunidades rurais, quilombolas e assentamentos foram beneficiárias de projetos do Esplar destinados à transição agroecológica, como o Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater).
“A agroecologia é sim algo concreto e permite que as pessoas vivam das práticas que desempenham”, afirma a engenheira agrônoma Alexandra Magalhães, integrante do Esplar. Em vez de se submeterem a condições de subemprego nas cidades, trabalhadores e trabalhadoras rurais colhem hortaliças, verduras, frutas e cereais de seus roçados agroecológicos, canteiros e quintais produtivos, criam animais e podem vender sua produção em feiras ou fornecer para programas federais, como o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
Atividades que possibilitam viver com dignidade no semiárido. “Mulheres estavam pensando em deixar a comunidade porque não tinham renda, mas permaneceram no campo depois que se inseriram no PNAI, depois que tiveram uma horta”, lembra ela.
O agrônomo Ronildo Mastroianni, coordenador do projeto ATER Agroecologia Sertões de Sobral enfatiza que é preciso planejamento para lidar com a estiagem. “Precisamos trabalhar a estocagem de água, de alimento, pequenos animais e plantas. As cisternas contribuem fundamentalmente para garantir o direito à água para consumo e produção”, defende.
Mesmo encontrando resistência em mudar as formas tradicionais de plantio e iniciar manejo ecológico da terra, e com a limitação para acompanhar proximamente as mais de 400 famílias, a técnica Luzia Márcia Costa vê as mudanças em comunidades que aderiram ao cultivo agroecológico.
“Conseguimos fazer algo concreto, temos comunidades que trabalham com o roçado agroecológico, outras com hortas, que já estão semeando. A realidade é de falta de água, com dificuldade, mas nem por isso estão deixando de fazer. As mulheres chapeleiras que já estão tendo renda para a sua família”, descreve.
Mudar as práticas para permanecer no campo
Mardônio Martins nasceu na região rural do município de Monsenhor Tabosa e estudou agropecuária em uma Escola Família Agrícola (EFA), centro de formação criado para dar condições de permanência dos sertanejos na sua terra.
Sua família cria animais e cultiva a terra de forma sustentável, mas no início houve resistência às mudanças, lembra ele. “Quando as famílias veem que está dando certo, elas continuam o processo. Minha família não queima a terra, planta em curvas de nível e nossa produção é comercializada pelo Programa de Aquisição de Alimentos. Meu pai e minha mãe têm uma fonte de renda através desses projetos”, afirma.
Uma nova prática para a pecuária é plantar Palma para alimentar os animais, o que diminui a necessidade de água para os bichos. “Hoje a gente cria galinhas, porcos, tem apicultura e consegue trabalhar com o pouco de água que tem. tudo isso é convivência, adaptação com a realidade”, afirma ele.