Com chocalhos e tambores, reverenciavam Pai Tupã, Mãe Tamaí e entoavam canções de lamento pelos povos indígenas expulsos de suas terras e que agora lutam para ter de volta o chão para morar e trabalhar.
Na Aldeia Santo Antônio Pitaguary, localizada município de Maracanaú, representantes das 14 etnias do Ceará foram convocados/as no dia 14 de setembro para II Encontro de Caciques, Pajés e Lideranças Tradicionais dos Povos Indígenas do Ceará, no qual vivenciaram momentos de espiritualidade e de decisão sobre o futuro da etnia Pitaguary.
De pé, sobre as raízes da árvore, a Cacique Pequena da tribo Jenipapo-Kanindé falou aos/às líderes e exortou a união dos povos indígenas pela demarcação de terras. Pequena desejou paz na aldeia Pitaguary e lembrou do mau presságio que teve anos atrás ao visitar o lugar. “Eu vim aqui e vi esta mangueira derramando lágrimas”. Para a anciã, este foi o sinal do conflito que aconteceu após a morte do líder local, no ano passado.
Assista ao ritual de toré dos povos indígenas do Ceará
Cacique Daniel era admirado dentro de sua comunidade e conduzia as 250 famílias do povo Pitaguary há 29 anos. Depois de sua morte, um grupo passou a reivindicar a liderança para seu enteado, o que não foi aceito pela maioria dos/as habitantes da aldeia. “Iniciou-se um conflito interno que gerou uma onda de violência pelo grupo que quer o cacicado, está difícil viver na aldeia”, denuncia João Paulo da Silva Lima, um dos quatro novos caciques escolhidos/as pelo pajé dos Pitaguary e reconhecidos/as pelo movimento indígena do Ceará.
O/a cacique é o/a líder político da tribo, representa a aldeia em processos jurídicos e une o povo para reivindicar os direitos originários sobre as terra. João Paulo argumenta que, para a escolha, são observados critérios como integridade, boa conduta e conhecimento das tradições. “Nos Pitaguary, é observado a caminhada da liderança”, diz ele.
Os crimes de cárcere privado, tentativa de homicídio e ameaça, ocorridos nas aldeias de Maracanaú, foram denunciados ao Ministério Público Federal, mas os processos estão parados. A indefinição sobre os/as atuais representantes da etnia Pitaguary também tem atrasado o repasse de indenizações a que a aldeia tem direito. “Tenho que receber todo mundo e tentar apaziguar. Pelo que senti, muitos processos e inquéritos estão engavetados”, afirmou Luiz Maia, coordenador regional da FUNAI empossado em setembro. Ele prometeu acompanhar o andamento destas questões e também afirmou que visitaria cada aldeia do Ceará para assessorar os povos tradicionais.
Cacicado reconhecido
Em cerimônia realizada na escola indígena da aldeia, foi lido o documento que reconhece Maria Madalena Braga da Silva, Ana Cláudia Araújo Lima, José Maurício de Lima, e João Paulo da Silva Lima como caciques Pitaguary. Os/as quatro tiveram apoio da maioria dos homens e mulheres indígenas presentes. A nota foi elaborado por lideranças das 14 etnias do Ceará, na ocasião da Assembleia Geral dos Povos Indígenas do Ceará (em Novo Oriente)
Ouvir o povo, ter sabedoria para lidar com os problemas, humildade para aceitar as ideias de todos/as são características exigidas das lideranças indígenas. Desta forma, tiveram vitórias como a concessão de posse da terra aos Tapeba de Caucaia e a demarcação do espaço dos Tremembé da Barra do Mundaú , que confrontavam empresas interessadas em construir um hotel dentro de seu território. “Todos nós somos povos indígenas e estamos lutando pelo mesmo motivo: a terra demarcada, temos que nos unir”, declarou a líder Evanilde Tapeba.
Saiba mais sobre o II Encontro de Caciques, Pajés e Lideranças Tradicionais dos Povos Indígenas do Ceará